O peso esmagador das expectativas
Sexta-feira, 05 de Setembro de 2025    12h22

O peso esmagador das expectativas

Como reconhecer nossos limites e descansar na graça de Deus

Fonte: Kelly M. Kapic
Foto: Reprodução

 

Você está exausto? Experimenta um sentimento constante de culpa sobre não conseguir fazer muito a cada dia? Está sobrecarregado por uma sensação de que há muito a fazer e você não está tendo quase nenhum progresso? Como estão seus planos, esperanças e sonhos? 

Uma das áreas que eu não planejava investigar em minhas pesquisas para este livro, mas que se mostrou verdadeiramente significativa, foi o sistema educacional americano. Dediquei mais atenção às escolas e faculdades. O que notei foi como os padrões educacionais que aprendemos lá muitas vezes promovem expectativas insalubres de quanto se deve “dar conta” em um dia. Agora, antes de falar mais a respeito, deixe-me esclarecer que isso parece afetar mais as escolas públicas e privadas de renda média e alta do que as escolas em áreas de baixa renda. Dito isso, aqui está um dia comum para muitos alunos do ensino médio norte-americano: 

  • Sair de casa para a escola por volta das 7h30 ou mais cedo. 
  • Assistir a aulas até as 15h30. 
  • Ir imediatamente para atividades extracurriculares (esporte, teatro etc.) até as 18h ou 19h. 
  • Correr para casa; jantar e banho rápidos.
  • Em seguida, pelo resto da noite, estudar quase sem parar a lição de casa, terminando e indo para a cama às 22h30 ou mais tarde.
  • Esse cronograma básico parece dolorosamente familiar para meus próprios alunos, mas eles hesitam em admitir o custo que lhes exige. Absorveram a visão de que esse padrão é moralmente “certo” e “esperado”: ocupe seu dia da manhã até a hora de dormir com o máximo de coisas possível. Consequentemente, muitos alunos que estão correndo assim e não conseguem dar conta passaram a acreditar que são uma decepção, são fracos ou algo pior. Eles não conseguem dar conta, e equiparam essa incapacidade a uma deficiência moral de sua parte. Acrescente a isso os desafios de entrar na faculdade, e eles chegam à visão inquestionável de que obter certas notas não é algo apenas valioso, mas também define seu valor. É fácil para os adultos dizer que “notas não são tudo”, enquanto todas as nossas outras ações e palavras ensinam os alunos a não acreditar nesse conforto pretendido. Portanto, tirar uma nota 8, ou pior, um 7, não é apenas tido como o reflexo das dificuldades do aluno em uma matéria; muitas vezes é subconscientemente usado como sua avaliação moral. 

    Sou um professor universitário que lida regularmente com alunos. Qualquer um que se proponha a ouvir descobrirá que eles costumam viver ao menos com certo sentimento de culpa por tudo que não conseguem fazer. Tantas páginas não lidas, tarefas intermináveis que fizeram às pressas, atividades que perderam e amizades que negligenciaram ou nunca formaram. Claro, é fácil dizer que eles não estão usando bem seu tempo, que eles se distraem demais (o que às vezes é verdade!), mas essa afirmação geralmente funciona como uma desculpa fácil para não considerar, de maneira honesta, se há algum problema no modo como configuramos as coisas na educação formal. Curiosamente, alguns alunos também me dizem que não se sentem tão culpados por não fazerem todas as tarefas, pois acreditam que seus professores (incluindo eu) têm expectativas muito irreais; acreditam que não há como fazer tudo o que se espera deles em uma semana. Em outras palavras, não apenas os alunos, mas também os professores mostram dificuldades em terem expectativas realistas ou entenderem o quanto as tarefas exigem em termos de esforço e tempo. Por isso, alguns alunos se desligam enquanto outros freneticamente tentam acompanhar, mesmo quando sentem que estão se afogando aos poucos. Contudo, esse não é um desafio apenas para alunos e professores.

    No meu trabalho, sempre há pessoas e projetos que precisam de mais atenção do que consigo lhes dedicar. Outros enfrentam frustrações semelhantes: o operador do armazém sempre pode ser mais eficiente em lidar com o estoque; o corretor de imóveis nunca vende casas o bastante; a dona de casa parece nunca conseguir chegar àquele canto bagunçado num cômodo específico. Os conselheiros poderiam ter feito perguntas melhores; os professores poderiam estar mais bem preparados a cada dia para as aulas; e os alunos gostariam de conseguir concentrar sua atenção por mais tempo. Os recepcionistas poderiam ser mais organizados e eficientes, enquanto os gerentes sonham em ser mais proativos do que reativos. Todos nós colidimos constantemente com nossos limites. Suas circunstâncias de trabalho provavelmente são diferentes das minhas, porém nós dois nos perguntamos se fizemos “o bastante”. Será que estamos sendo movidos pelos impulsos errados e temos os objetivos errados em mente? 

    [A forma como eu passo este dia comum em Cristo é como passarei minha vida cristã. 

    Tish Harrison Warren, Liturgia do Ordinário]

    E as preocupações eclesiásticas e missionárias? Devemos orar, escrever mensagens encorajadoras e oferecer refeições aos necessitados. Inúmeras organizações excelentes precisam desesperadamente de tempo e recursos para poderem cuidar dos pobres, adotar os órfãos e ajudar os aprisionados; no entanto, com que frequência eu participo? E, quando o faço, quase sempre parece uma pequena gota em um enorme e vazio balde de necessidades. Eu não deveria fazer mais? Então, quando sinto meus limites, sou tentado a fingir que esses problemas não são tão ruins ou que Jesus não disse que eles exigem a atenção de seu povo. Talvez ajudar os pobres e órfãos seja opcional, não essencial. Talvez a oração seja uma ótima ideia, mas não tão necessária assim. Entretanto, tal negação também não é saudável, pois distorce nossa visão de Jesus e deforma nossa compreensão do próprio Deus. O que devemos fazer então? Como devemos reagir a essas necessidades do evangelho e à nossa própria capacidade limitada de responder a elas? 

    Ademais, há o meu corpo. A cada ano que passa, o metabolismo desacelera, as dores aumentam e há a inegável sensação de que ele precisa de mais atenção, desde a comida que consumo até o exercício de que preciso para compensar meus padrões de trabalho sedentário. Negligenciar o cuidado com o nosso corpo tem consequências maiores do que queremos admitir: os problemas não estão apenas relacionados à nossa cintura, mas aos nossos relacionamentos e inúmeras outras áreas da vida. O livro de Provérbios há muito tempo nos alerta que usar mal nosso corpo ou nunca restringir nossos apetites podem produzir consequências negativas (por exemplo, Pv 20.1; 23.1-3, 20-21; 25.16, 27). 

    E quanto à minha mente? Sou um acadêmico, sou pago para passar minhas horas estudando, ensinando e escrevendo. Adivinhe: eu simplesmente não consigo dar conta — longe disso! Por favor, não conte a ninguém. Novos livros e artigos aparecem todas as semanas. Além disso, conheço mais pessoas a cada ano, incluindo novas safras de alunos e pessoas novas na igreja — esqueço tantos nomes, que chega a doer. Ou, mais precisamente, dói lembrar de tão poucos nomes. Minha mente simplesmente não consegue acompanhar as demandas intermináveis… e sinto-me culpado por isso. Quando Paulo nos chama para renovar a nossa mente (Rm 12.2), o que isso exige de nós? E por que sempre abordamos essas questões presumindo que a meta ou modelo é um gênio idealizado, em vez de olhar para pessoas com QIs severamente limitados que, não obstante, amam profundamente a Deus e ao próximo? Talvez tenhamos valorizado o nosso cérebro de uma forma errada, distorcendo nossa visão de ser humano. 

    E a família? Sou pai de dois filhos incríveis — isso deveria ser fácil, já que conheço pessoas com quatro filhos ou mais. No entanto, sempre seria possível passar mais tempo com os dois; mais tempo jogando cartas, rindo, conversando ou apenas estando juntos. Da mesma forma, sou casado, e qualquer cônjuge autorreflexivo logo reconhece suas deficiências. Quero ser mais ponderado, mais atencioso; há sempre mais a ser dado. Todos nós poderíamos fazer mais para incentivar, capacitar e cuidar do nosso cônjuge. E como estou cuidando do relacionamento com os parentes, espalhados por todo o país? Não deveria fazer mais contato? Não seria bom nos reunirmos com mais frequência?

    A lista poderia seguir tocando outras esferas da vida, do cuidado da casa à educação, do envolvimento com a comunidade à recreação. Área após área, sentimos nossas deficiências, nossos anseios de ser mais, de fazer mais, e ainda assim nos deparamos com nossos limites.

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